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“MaXXXine” ou quando a estrela não brilha

Foto do escritor: MontezMontez
Foto: Divulgação A24

As redes sociais, ao longo dos anos, se consolidaram como um forte veículo de divulgação e publicidade dos filmes. Mais que isso: como uma ágora, tornaram-se um centro de encontro de pontos de vista, ora em concordância, ora em discordância. Muitos filmes ganham visibilidade através de memes ou montagens, destacando, para seu público, sua relevância. Constrói-se, então, uma base solidificada que blinda a obra em questão contra qualquer crítica negativa, transformando quem quer que a critique em um inimigo imediato. Esse comportamento, ainda que não generalizado, tem se tornado recorrente, seja porque determinado filme está envolto em questões identitárias – o que, para uma certa cinefilia, é a baliza de qualidade – ou porque sua abordagem estética é palatável, fugindo de uma cinefilia imaginária que supostamente estaria contra o identitarismo. 


Quando X (2022), de Ti West, chegou aos canais de distribuição online, consolidou-se como uma boa amostra do horror atual, sendo construído através da estética slasher, com referências diretas a clássicos como O Massacre da Serra Elétrica (1974, dir. Tobe Hooper) ou Sexta-Feira 13 (1980, dir. Sean S. Cunningham). Ao mesmo tempo, levava a sexualidade a outro patamar, buscando questionar o ar de puritanismo que envolvia certos lados do cinema. À época, com produções cada vez mais estéreis, nas quais o sangue e o sexo se tornaram pontos polêmicos, o longa conseguiu se sobressair nessas duas vertentes com competência, além de transformar Mia Goth em uma final girl que se torna maior que o próprio filme. Com a continuação Pearl (2022), West resolve tomar para si a Hollywood clássica, imprimindo o imagético da década de 1950 com certa competência, ainda que a racionalização da aparência seja perceptível. 


Em outros termos, é como se o diretor, munido de referências, quisesse torná-las ainda mais evidentes. Contudo, a contenção desse gesto acontece por causa, novamente, de Goth. Pearl, nas redes sociais, fez ainda mais sucesso que o primeiro da franquia, com dois de seus momentos, “I’m a Star” e o plano final, sendo constantemente replicados. Anabolizado por seu sucesso na World Wide Web, MaXXXine (2024) chega aos cinemas brasileiros com uma menor janela de lançamento em relação ao exterior e completamente blindado pela fanbase. Partindo do desejo da protagonista em se tornar uma estrela, West e Goth a levam a Hollywood, ao mesmo tempo que um assassino em série, conhecido como Night Stalker assombra as ruas da Cidade dos Anjos. É através dessas duas características que o filme demonstra sua inabilidade em se moldar dentro do que pretende. 

Foto: Divulgação A24

Com Maxine na fábrica de sonhos hollywoodiana, o diretor teria a possibilidade de brincar com a própria indústria de forma instigante – seja utilizando-se do cenário dos estúdios ou da feitura fílmica –, mas West está mais preocupado em construir em cima daquele espaço uma ideia muito pueril do que é referenciar clássicos. Ao contrário de Pânico (1996, dir. Wes Craven), que fazia isso com inteligência e habilidade, West parece não se contentar com a ideia de apenas imageticamente referenciar – ele faz questão que os personagens deixem isso claro, como no momento em que o Bates Motel surge como cenário. Mais ainda: nem as brincadeiras dentro daquele espaço avançam de forma satisfatória, demonstrando que o problema está nos próprios anseios do diretor. Ora, entendendo bem que se trata de um filme cuja força está nas redes e que o ambiente é propício para comentários rasos acerca das ambições fílmicas, o realizador parece compreender que a mera sugestão [de algo], sem qualquer função narrativa, é válida.

Mia Goth em MaXXXine. Foto: Divulgação A24

O que encontramos, portanto, é um filme cujas supostas homenagens se tornam tão pouco expressivas quanto o próprio longa, confiando que sua miríade de referências demonstra conhecimento; mas passa longe disso. Um dos exemplos mais evidentes é a forma que o giallo é posto dentro do longa. Consagrado por nomes como Mario Bava e Dario Argento, o giallo é um subgênero cinematográfico que, em linhas gerais, decorre em torno do suspense de quem é o assassino, com mortes marcadas por violência e criatividade. Quando West insere um serial killer de luvas pretas e chapéu, sua ideia de flerte com o giallo fica explícita, mas todo o mistério se enfraquece quando as suspeitas não encontram respaldo em qualquer outro personagem da trama, e o único suspeito possível se torna a escolha mais óbvia, encaminhando-se para um desfecho pouco inspirado. 


Tal ponto se torna um problema e uma surpresa: para um diretor que já mostrou ter mais coragem com o grafismo da violência em X, MaXXXine é seu filme mais limpo. E quando tal adjetivo é utilizado não é por não conter poucos momentos violentos, mas sim por todos eles serem produtos de uma estetização muito presente no cinema contemporâneo hollywoodiano em um filme que se passa na década de 1980, na qual muitos cineastas demonstraram uma ambição e uma coragem maior. O terceiro filme da franquia parece apostar que seus bons momentos pontuais – que servem muito bem para cortes em redes como o X (ex Twitter) e TikTok – são o que o fará permanecer dentro de um imaginário de qualidade; na verdade, é o projeto mais pálido entre os três. Maxine pode até ter se tornado uma estrela, mas o filme não consegue brilhar muito mais que uma lantejoula. 

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1 commentaire


Jessica Donato
Jessica Donato
11 juil. 2024

Que crítica incrível! Meus parabéns!

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