
O diretor uruguaio Fede Álvarez é novamente o escolhido de Hollywood para revitalizar uma antiga franquia de terror. Após dirigir o remake que retomou a franquia A Morte do Demônio (Evil Dead) em 2013, o cineasta agora assume a direção do mais novo filme da franquia Alien. Assim como em Evil Dead, Álvarez se mostra capaz de unir com sucesso a ação e o terror, de forma que uma decupagem e encenação mais práticas se mostram uma grande afirmação da vitalidade dos personagens, em oposição ao sombrio terror da morte materializada na figura alienígena e na opressão social. No entanto, também é notável a dependência de ambas as obras das exigências e padrões do mercado que, impostas pelos produtores ou não, incomodam com sua execução genérica no resultado.
Em suma, a ação do filme é motivada pela excursão de jovens trabalhadores que, desiludidos com a condição precária de vida no planeta em que vivem, decidem assumir controle de uma suposta nave espacial que está à deriva no espaço, a partir da qual conseguiriam estabelecer rota para outro planeta habitado. Desde o início, fica clara a crítica à opressão exercida pela empresa desse futuro distópico e enferrujado: na tentativa de coletar as suas passagens prometidas para fora do planeta, a protagonista Rain (Cailee Spaeny) e seu irmão sintético Andy (David Johnson) são enganados: vemos em primeiro plano que a funcionária deliberadamente aumenta além do prometido os créditos exigidos para a coleta da passagem e, no plano de fundo, vemos que Andy está sendo espancado por pessoas na rua em discriminação ao fato de ser um sintético. Na missão do grupo à nave, a relação conturbada com forças empresariais se acentua na figura do saudoso sintético Rook (interpretado por Daniel Betts com o rosto do falecido Iam Holm), em paralelo com a ameaça do alien xenomorfo.
Nesse sentido, Alien: Romulus (2024) é certamente um filme que trata o terror de maneira distinta das tendências industriais correntes. Sem qualquer resquício do chamado “terror psicológico”, o perigo da obra se materializa na figura do alienígena e na opressão empresarial. É interessante observar o potencial crítico que a ameaça material possibilita: diferente daquele terror pautado pelos traumas de um determinado personagem, o terror do alien materializado e os ambientes insalubres desse indesejável planeta representam uma ameaça externa, em relação à qual a condição psicológica dos personagens não importa diretamente. Assim, a batalha a ser travada é uma batalha pela sobrevivência acima de qualquer trauma individual ou Mau metafísico, que se expressa pela muito bem realizada ação presente sobretudo no fim da obra. O terror, com isso, serve de catalisador da ação e, se ele é representado materialmente, a ação dos personagens constitui somente uma reação à ameaça do medo que tem sempre origem externa.
Além disso, é notável a integração dos efeitos práticos e as CGI, que serve de bom exemplo do motivo pelo qual a pressuposição de qualquer efeito causado pelo uso dessas técnicas em particular é insustentável. Atualmente, corre na mídia um discurso que defende o uso de técnicas práticas na construção de cenários e figurinos como um invariável e insubstituível meio de naturalizar a imagem em contraponto à suposta artificialidade das imagens geradas por computador. Esse processo, contudo, além de muitas vezes noticiado de maneira enganosa — discussão que vai além do propósito deste texto — não se sustenta enquanto um filme como Alien: Romulus aproveita a união de ambas as técnicas de efeitos visuais (prática que é bastante comum) na criação da exótica forma de vida xenomorfa e usa as CGI com exclusividade para representar momentos de alta vitalidade dos personagens ou — novamente — ameaças bastante materiais. Do primeiro caso, exemplos claros são aqueles em que se mostra a vista do planeta (e de sua órbita) em que se desenrola a história com planos bastante contemplativos que aprazem o espectador e os personagens; naturalmente, tais planos são gerados artificialmente. No segundo exemplo, é interessante a cena em que um corredor em gravidade zero fica cheio de sangue ácido dos aliens; é claro que o sangue amarelo flutuante também é gerado artificialmente e gera uma situação tensa baseada na presença e no movimento físicos dos atores em meio a esse perigo bem concreto. Dessa forma, ficam evidentes as possibilidades de efeitos visuais distintas da norma pregada pelo discurso corrente.

No entanto, apesar da abertura do diretor à vasta gama de técnicas que expandem o potencial do terror e da ação, a obra por vezes acaba com o potencial limitado pela encenação genérica de parte do filme. Nesse sentido, o longa se assemelha a Evil Dead: apesar de sequências finais muito bem construídas e capazes de explorar bem a integração do terror com a ação, todo o terreno narrativo preparado no início do filme fica em um lugar-comum das narrativas hollywoodianas. Até o momento em que os aliens aparecem pela primeira vez, que também é a primeira cena realmente de terror do filme, tudo é bem na média da indústria, de forma que nada tem grande potencial expressivo além da construção do ambiente que apresenta esse futuro enferrujado, bastante característico dos primeiros filmes da franquia. Essa mediocridade é sobretudo causada pela exaustiva apresentação de conceitos sem correlação estética na obra, de forma que muito se fala, muito se estabelece e pouco se expressa por linguagem de cinema (audiovisual).
Para além dos problemas genéricos da obra, é preciso exaltar a capacidade expressiva do filme na sequência final. Como já foi dito, toda a ação da qual os personagens fazem parte é sobretudo uma reação à ameaça material do terror. Dado que esse teor é materializado seja na forma da criatura assassina ou da empresa negligente à vida das pessoas, a ação que surge como reação é uma afirmação de vida. Na sequência final, isso é levado ao extremo: com praticamente nenhuma fala, Rain desempenha um longo embate contra o inimigo final, que é uma nova espécie de alien humanoide. Esse embate é como uma exibição dos instintos humanos da protagonista em uma decupagem bastante prática que mostra ação e reação de Rain como uma relação de causa e efeito não mediada por conceitos. Ela age conforme seus instintos e, após uma grande sequência cujo silêncio fala pelo fôlego preso, solta um intenso grito de raiva ao acabar definitivamente com a ameaça alienígena. Ao fim, a vida prevalece sobre a morte mediante um grito bastante humano.
Portanto, é com alguns deslizes não raros nas produções da grande indústria que Alien: Romulus se apresenta com uma abordagem do terror um tanto distinta do que foi padronizado nos últimos anos, fazendo bom uso da integração de técnicas visuais práticas e geradas por computador. Através da materialização do terror, a ação ganha também contornos diretos, de forma que o diálogo entre os gêneros constitui o verdadeiro embate do filme, que sintetiza bem a relação entre a humanidade e a ameaça de morte. Frente ao terror, frente à morte, frente à opressão, põe-se a ação, movimenta-se — e o movimento é que dá vida ao cinema.
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